Representantes da força sindical e trabalhadores de diversos segmentos foram ouvidos pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal em um debate sobre a proposta de isenção do Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil por mês, apresentada como o primeiro passo em direção à justiça tributária no país. O encontro foi conduzido pelo presidente da CAE e relator da proposta, senador Renan Calheiros (MDB-AL), que criticou a demora na análise do texto pela Câmara dos Deputados.
Para ele, é “inacreditável” que um projeto com impacto positivo sobre cerca de 90% da população brasileira tenha sido usado como “instrumento de chantagem” para pautar outras matérias, como a PEC do Mandato Parlamentar (PEC 3/2021) e a anistia aos envolvidos nos ataques de 8 de janeiro de 2023.
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Renan afirmou que o projeto terá tramitação rápida no Senado e que não aceitará interferências externas. “Aqui não haverá lobistas influindo na votação, nem tentativas de usar o texto para aprovar temas alheios ao interesse público, como blindagens ou anistias”, disse. O relator antecipou que pretende manter no texto o dispositivo que prevê a correção automática anual da tabela do IR.
O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), destacou que a correção da tabela é apenas o início de uma jornada mais ampla para reduzir desigualdades sociais e regionais. “Estamos começando a corrigir uma injustiça histórica. O Brasil, embora seja a nona economia do mundo, está entre os países mais desiguais do planeta”, afirmou.
Segundo ele, a ampliação da isenção será compensada pela tributação de 141 mil brasileiros da faixa mais alta de renda — o equivalente a 0,1% da população.
Representantes de trabalhadores do comércio e de outras categorias defenderam que o projeto fortalece a progressividade do sistema tributário, em que quem ganha mais paga mais. O comerciário Tiago Bitencourt Neves afirmou que a proposta representa uma “ideia de país”.
“A progressividade tributária é mais que uma política econômica: é uma visão de nação. Um país onde quem tem mais contribui mais, e quem ganha menos não é penalizado por consumir o básico. Justiça fiscal é sinônimo de dignidade e oportunidade para todos”, destacou.
O mesmo posicionamento foi compartilhado por Jadiel de Araújo Santos e Willian Ferreira da Silva, que enfatizaram o impacto positivo da medida sobre o consumo e o poder de compra das famílias. “Estamos devolvendo dignidade, poder de compra e esperança a milhões de lares. Esse dinheiro volta para a mesa, a escola dos filhos e o comércio local — é economia real”, disse Jadiel.
O bancário Juliano Rodrigues Braga defendeu que o sistema tributário brasileiro precisa refletir a capacidade contributiva de cada cidadão. Segundo ele, caso o projeto seja aprovado, o ganho anual em sua renda pode chegar a R$ 2,5 mil. Ainda assim, considerou que o texto apenas “amortiza” uma defasagem histórica.
- Leia também: Isenção do IR até R$ 5 mil: Haddad defende proposta e diz que deficit será o menor em anos
“Entre 1996 e 2024, a tabela do Imposto de Renda acumulou defasagem de cerca de 134%. A proposta reduz esse atraso para 35%, segundo o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal. É um avanço, mas há muito a ser feito”, pontuou.
A nutricionista Zuila Acioly Marques Leite reforçou que a medida favorece profissionais que não têm piso salarial e enfrentam baixos rendimentos. “A isenção até R$ 5 mil impacta de forma direta quem vive com orçamentos apertados. A aprovação vai estimular a economia local e o consumo de bens e serviços”, afirmou.
O texto também prevê redução gradual do IR para quem ganha entre R$ 5 mil e R$ 7.350 mensais. Acima desse valor, não há mudanças. Para compensar a isenção, a proposta cria um imposto mínimo de 10% sobre rendimentos anuais superiores a R$ 600 mil, atingindo cerca de 141,4 mil contribuintes de alta renda — grupo que atualmente paga, em média, apenas 2,5% de IR sobre seus rendimentos totais.
Orientação do governo e próximos passos
Em audiência anterior da CAE, realizada ontem (14), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, pediu que o Senado aprove o texto sem mudanças de mérito para evitar que o projeto retorne à Câmara dos Deputados.
A Comissão de Assuntos Econômicos deve realizar mais duas audiências públicas sobre o tema na próxima semana antes de votar o relatório de Renan Calheiros.