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Brasil cobra EUA por maus-tratos a repatriados

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O governo federal exigirá da administração de Donald Trump explicações sobre os relatos de maus-tratos aos brasileiros repatriados por entrarem ilegalmente nos Estados Unidos, que chegaram na noite de sábado ao Aeroporto Internacional de Belo Horizonte, em Confins, na Região Metropolitana da capital mineira. Segundo o Ministério das Relações Exteriores (MRE), o grupo foi submetido a “tratamento degradante” e “inaceitável” — os deportados desembarcaram em Manaus algemados e com os pés acorrentados.

As informações foram reunidas pelo MRE, pela Polícia Federal (PF) e pela Aeronáutica. As agressões aos repatriados configura violação dos termos do acordo firmado entre Brasil e EUA, em 2018, para a devolução de brasileiros que sejam presos por entrarem ilegalmente em território norte-americano.

No sábado, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, reuniu-se com o delegado federal Sávio Pinzón, superintendente interino da PF no Amazonas, e com o major-brigadeiro Ramiro Pinheiro, comandante do 7º Comando Aéreo Regional. Nesse encontro, “foi efetuado relato detalhado sobre os incidentes”, segundo o MRE. O encontro subsidiará o pedido de explicações ao governo norte-americano.

De acordo com o MRE, a aeronave fretada pelo governo dos EUA para a deportação apresentava problemas técnicos, como “pane no ar-condicionado”. Há relatos, também, de agressões com chutes e sufocamentos por “mata-leão” por parte dos seguranças contratados para acompanhar os repatriados.

A ministra dos Direitos Humanos, Macaé Evaristo, expressou a indignação do governo em vídeo divulgado nas redes sociais do presidente Luiz Inácio Lula da Silva: “Não podemos suportar a violação dos direitos humanos. O que aconteceu nesse voo foi uma violação aos direitos dos brasileiros”, afirmou.

O superintendente da PF em Minas Gerais, Ricardo Murad Macedo, também se pronunciou sobre o caso: “Fizemos todos os procedimentos de forma célere e buscando preservar ao máximo a dignidade desses cidadãos”, relatou.

No sábado, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, considerou inaceitável que os deportados tivessem sido presos pelos pés e pelas mãos durante o voo — classificou a situação como um “flagrante desrespeito aos direitos fundamentais dos cidadãos brasileiros”. A situação foi a ele comunicada pelo diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues. Em Manaus, os agentes federais determinaram aos representantes do governo norte-americano a imediata retirada das algemas.

O presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), também se manifestou e afirmou preocupação com o tratamento do governo dos EUA ao brasileiros. “A decisão por um novo procedimento na política de imigração, que é um direito assegurado a todos os países, não pode vendar nossos olhos diante de situações degradantes e denúncias de agressões e maus-tratos. O respeito à dignidade humana é um conceito consagrado em um mundo civilizado e democrático”, salientou.

Desconfortos, ameaças e humilhações 

Os brasileiros deportados dos Estados Unidos relataram, logo depois de desembarcarem no Aeroporto de Confins, que a aeronave disponibilizada pelo governo norte-americano estava em condições precárias. Eles foram levados para Belo Horizonte por um jato da Força Aérea Brasileira (FAB), que os pegou em Manaus — onde o avião que os trouxera dos EUA teve de descer por problemas técnicos.

O goiano Kalebe Barbosa Maia, de 28 anos, estava há seis anos nos Estados Unidos e foi preso há seis meses. “Foi uma viagem muito difícil até chegar aqui, ao Brasil. Fomos muito humilhados pela imigração americana. Trataram a gente muito mal. (O jato) parou no Panamá. Teve problemas técnicos, teve que viajar com um mecânico dentro do avião. O ar-condicionado estragou. A turbina do avião falhando. As condições eram precárias. Foi um momento desesperador”, disse, acrescentando que o grupo foi mal alimentado — ao contrário dos seguranças e tripulantes.

Carlos Vinícius de Jesus, de 29 anos, de Vespasiano (MG), ressalta que “o pessoal de Manaus é que recebeu a gente bem e acolheu. Eu tive que subir em cima da asa para pedir socorro. Os americanos são hipócritas. Eles me falaram: ‘Que se dane seu governo. Se a gente quiser, fecha a porta da aeronave, desce e mata vocês’. Foi o que eles falaram”.

Motim a bordo

O curitibano Mário Henrique Andrade Matheus, de 41 anos, tinha marcas vermelhas nos pulsos que, segundo relatou, foram causadas pelo agentes de imigração norte-americanos que os acompanharam. Ele afirmou que, ao chegarem ao Amazonas, os oficiais dos EUA não quiseram deixá-los desembarcar, apesar de o ar-condicionado estar desligado.

Isso fez com que passageiros, entre eles mulheres e crianças, passassem mal, e que outras pessoas que estavam sendo deportadas começassem a se rebelar ante a situação. A indignação teria sido respondida pelos estrangeiros com socos e chutes.

“Nós sem ar-condicionado, com pessoas desmaiando dentro do avião, fizemos força para sair. Eles agrediram alguns dos meninos. Aí, todo mundo ficou quieto. Quando chegou a Manaus, aconteceu a mesma coisa. A aeronave parou de funcionar e ficamos sem ar condicionado e tudo trancado. As crianças passando mal, os meninos falando para tirá-las, botar para fora para receberem o auxílio necessário. Mas os agentes dos Estados Unidos não queriam deixar a gente sair”, narrou.

O mineiro Matheus Lopes, de 23 anos, relatou dificuldades para ir ao banheiro durante o voo por causa das algemas. “Braço, barriga, perna. Eles não tiravam a algema nem para a gente ir ao banheiro”, desabafa. Segundo os brasileiros, as mãos estavam algemadas, os pés acorrentados e ainda havia outra algema na cintura.

O vigilante Jefferson Maia, de 26, natural de Ji Paraná (RO), foi preso na fronteira com o México e, no voo, disse que foi agredido por agentes — mostrou um braço inchado para confirmar a acusação. O vigilante relatou que os brasileiros forçaram a saída de emergência da aeronave e foram para uma das asas pedir socorro porque, dentro do avião sem ar condicionado, a situação era insuportável.

O carpinteiro Aelinton Cândido, de 43, de Divinópolis (MG), trabalhava na construção civil em Nova York. Sobre a viagem de volta ao Brasil, foi enfático. “Foi a pior coisa que passei na vida. Tive medo de morrer. Foi uma tentativa de assassinato o que aconteceu conosco. Tenho diabetes, que desenvolvi por má alimentação e por não ter tratamento na prisão. Ninguém te ajuda a conseguir emprego ou a regularizar sua situação”, disse.

Passageiros afirmaram que, em solo brasileiro, os agentes quiseram tirar as algemas antes de os policiais federais entrarem no jato para disfarçar a situação em que eram transportados. (Com Agência Estado e Mariana Costa e Thiago Bonna, do Estado de Minas)

 

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